O setor agroalimentar seguirá ao longo de 2023 impactado pelas tensões de abastecimento que surgiram com o início da guerra na Ucrânia. Essa é a avaliação de economistas da Coface, líder global em seguro de crédito comercial e em serviços especializados, que analisaram as perspectivas para o setor durante o webinar “Setor Alimentar Global: Oportunidades e Riscos”.
Simon Lacoume, Economista do Grupo Coface especializado em Agroalimentar, afirmou que as incertezas sobre as rotas comerciais na área do mar Negro restringem o comércio global de cereais, cuja produção global deve cair 1,0% em 2022/23. Além disso, a destruição de área de cultivo da Ucrânia pode reduzir disponibilidade de volume de grãos no mercado global.
“A produção de agricultura está severamente impactada ainda pelos efeitos da guerra da Ucrânia. A tendência é que os preços ainda vão continuar em patamares elevados para 2023 e 2024”, afirmou o economista.
Outro risco apontado por Lacoume para setor é a renovação de medidas protecionistas por alguns países (como Egito, Índia) para lidar com pressões inflacionárias ou escassez de alimentos. Ele falou ainda sobre os impactos de eventos climáticos esperados a partir do segundo semestre.
“A maioria dos modelos indica que o La Niña está terminando e ocorrerá a transição para ENSO-neutro durante março/abril de 2023. Depois disso, há uma grande chance de o ENSO-neutro persistir até julho de 2023, seguido de uma transição para o El Niño. As probabilidades de El Niño são cada vez mais fortes, acima de 80%, a partir de setembro”, reforçou em sua apresentação.
O economista avalia que o alto nível de preços das rações (milho, soja) impactam significativamente os custos da pecuária podem impulsionar preços crescentes de produtos de origem animal (laticínios, carne, ovos) e indústrias de alimentos processados.
América Latina
Patricia Krause, Economista da América Latina na Coface, também destacou que as condições meteorológicas continuam a ser uma grande fonte de incerteza, com a transição de La Niña para um possível El Niño, ao traçar os cenários para o setor agroalimentar para a região.
A economista chamou atenção para os patamares ainda elevados da inflação de alimentos na região, embora os índices tenham apresentado uma moderação na margem. “Isso acaba afetando o poder de compra das famílias, especialmente de baixa renda. O setor de alimentos é o mais resiliente, a alimentação é a última coisa a ser cortada, mas ao mesmo tempo você acaba tendo substituições. Então há oportunidade para empresas para alguns segmentos, enquanto outros terão um cenário mais difícil”, afirmou.
Patricia avalia ainda que a forte alta dos juros promovia pelos bancos centrais deve afetar as empresas altamente alavancadas do setor na região. “É importante monitorar de perto o andamento das empresas e sua capacidade de renovação de crédito”, completou.
Argentina e Brasil
Na Argentina, forte seca afetará a safra 2022/2023, no terceiro ano de La Niña, resultando no pior desempenho para o setor em mais de 20 anos. São espetadas fortes quedas na produção de trigo estimada em 11,5 milhões de toneladas (-50% a/a), milho em 32 milhões (-37%) e soja em 23 milhões (-45%), o que também está se tornando um grande problema para o setor de carne.
“Ao contrário de 2022, desta vez os preços das commodities agrícolas não serão suficientes para compensar o menor volume de produção. Haverá efeitos sobre as exportações, com cenários previstos de queda de US$ 20 bilhões neste ano. E isso é muito importante para o governo, em um momento de escassez de reservas cambiais, uma vez que o setor agro é a principal fonte de dólares”, disse.
Já para o Brasil, a perspectiva bastante favorável para a safra neste ano, que deve ser recorde com uma alta de quase 15% em comparação com o último ano. “As principais culturas, soja e milho, devem apresentar crescimento bastante expressivo. O ponto de atenção neste momento é a questão dos preços internacionais, que apresentam alguma moderação. A questão é se essa redução irá se sustentar adiante”, afirmou Patricia, acrescentando que o um maior crescimento na China poderia favorecer as exportações agrícolas brasileiras.